Resumo
A partir de elementos e passagens da obra de Graça Graúna, pensadora indígena Potiguara, este artigo discute a importante contribuição da literatura indígena contemporânea na renovação da teoria social a respeito do Brasil e seu povo, tensionando a sociologia brasileira hegemônica na nossa representação de sociedade nacional, com destaque para a superação da invisibilização étnica atravessada pelo desejo de emancipação social em perspectiva pluricultural. Com base no estudo da questão indígena e do indianismo na literatura brasileira, desde as crônicas dos viajantes e missionários do período colonial até a atualidade, bem como na leitura da própria autora sobre esses cânones, é mostrado como os povos originários foram sendo convertidos, excluídos, tornados cativos, associados a perdedores e subespécies. Ou seja, apagados da condição de sujeitos e de suas realidades socioculturais pelos esforços empreendidos pela intelligentsia brasileira no sentido de propagar ideias sobre o povo brasileiro e sua identidade enquanto nação eurocentrada. Por fim, são apontadas a interpretação de Graça Graúna sobre educação e direitos humanos, sua atuação contra a tese do “Marco Temporal” e a favor da sororidade entre as parentes indígenas. Espera-se, com essas reflexões e análises, jogar luz sobre projetos literários alinhados às cosmologias, auto-histórias e saberes indígenas na produção de um pensamento social de perspectiva decolonial e sensibilidade feminista, na construção de novo(s) projeto(s) coletivo(s) utópico(s) para o país.
Referências
ALMEIDA, Tânia Mara Campos de. A invenção do Estado-Nação e o caso brasileiro. In: Revista Múltipla, v. 3, n. 4, p. 71-84, 1998.
BOSI, Alfredo. História concisa da literatura brasileira. São Paulo: Cutrix, 2006.
BRASIL. Lei 11.645/08 de 10 de Março de 2008. Diário Oficial da União, Poder Executivo, Brasília.
CARVALHO, José Jorge. Encontro de Saberes e cotas epistêmicas: um movimento de descolonização do mundo acadêmico brasileiro. In: BERNARDINO-COSTA, Joaze; MALDONADO-TORRES, Nelson; GROSFOGUEL, Ramón. (Orgs.). Decolonialidade e pensamento afrodiaspórico. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2018.
CUNHA, Manuela Carneiro da. Imagens de índios no Brasil. Estudos Avançados, v. 4, n. 10, p. 91-110, 1990.
DORRICO, Julie. Literatura indígena brasileira contemporânea: Criação, crítica e recepção. In: DORRICO, Julie, et al. (Orgs). Literatura indígena brasileira contemporânea: criação, crítica e recepção. Porto Alegre: Editora Fi, 2018.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da indignação: cartas pedagógicas e outros escritos. São Paulo: Editora UNESP, 2000.
GRAUNA, Graça. A literatura indígena continua se perguntando: em quanto tempo passam 500 anos?, 2002. Disponível em: http://www.dhnet.org.br/direitos/militantes/ggrauna/ggrauna_literatura_indigena_perguntando.pdf. Acesso em: 19 jan. 2022.
GRAÚNA, Graça. Canto Mestizo. Maricá: Blocos, 1999a.
GRAÚNA, Graça. Carta ao Brasil-Pindorama, 2021. Disponível em: https://gracagrauna.com/category/bem-viver/. Acesso em: 19 jan. 2022.
GRAÚNA, Graça. Contrapontos da literatura indígena contemporânea no Brasil. Belo Horizonte: Mazza Edições, 2013.
GRAÚNA, Graça. De Graça Graúna para os Ancestrais. In: XUCURU-KARIRI, Rafael.; COSTA, Suzane L. (Orgs.). Cartas para o bem viver. Salvador: Boto-cor-de-rosa livros arte e café /paraLeLo13S, 2020a.
GRAÚNA, Graça. Educação, literatura e direitos humanos: visões indígenas da lei 11.645/08. Educação & Linguagem, v. 14, n. 23/24, 231-260, jan-dez., 2011a.
GRAÚNA, Graça. Flor da Mata. Belo Horizonte: Peninha Edições, 2014a.
GRAÚNA, Graça. Geografia do poema. In: DORRICO, Julie. (Org.). Dossiê Poesia Indígena Hoje, nº 1, agosto de 2020b. Disponível em: https://www.p-o-e-s-i-a.org/dossies. Acesso em: 19 jan. 2022.
GRAÚNA, Graça. Graça Graúna: “Ao escrever, dou conta da ancestralidade, do caminho de volta, do meu lugar no mundo”. In: LOURES, Marisa. Tribuna de Minas, 2019. Disponível em: https://tribunademinas.com.br/colunas/sala-de-leitura/06-08-2019/graca-grauna-ao-escrever-dou-conta-da-ancestralidade-do-caminho-de-volta-do-meu-lugar-no-mundo.html. Acesso em: 19 jan. 2022.
GRAUNA, Graça. Literatura e violência: dos saberes ancestrais à exclusão. In: SILVA, Denise A.; PORTO, Luana T. (Orgs.). Pensando as Américas: narrativas e violência. Santa Cruz do Sul: Catarse, 2016.
GRAÚNA, Graça. Literatura: Diversidade Étnica e outras Questões Indígenas. Todas as Musas. Ano 05. Número 02. Jan-Jun, 2014b.
GRAÚNA, Graça. Retratos. In: SIQUEIRA, Elizabeth (Org.). Antologia retratos. Edições Bagaço, Recife/PE, 2004.
GRAÚNA, Graça. Toda história tem uma voz primeira. Disponível em: https://gracagrauna.com/2021/09/12/toda-historia-tem-uma-voz-primeira/. Publicado em 12 de setembro de 2021. Acesso em: 19 jan. 2022.
GRAÚNA, Graça. Um flagrante do marginalizado na literatura brasileira. CIMI. Jornal Porantim, nº 216, julho de 1999b. Disponível em: http://www.docvirt.com/docreader.net/DocReader.aspx?bib=HemeroIndio&pagfis=66. Acesso em: 19 jan. 2022.
HOBSBAWM, Eric. A invenção das tradições. São Paulo: Paz e Terra, 1984.
JARDIM, Raoni Machado Moraes. Educação intercultural e o Projeto Encontro de Saberes: do giro decolonial ao efetivo giro epistêmico. Tese, Doutorado em Ciências Sociais, Universidade de Brasília, Brasília, 2018.
KRENAK, Ailton. Caminhos para a cultura do bem viver. Org.: Bruno Maia. Texto elaborado a partir de live, e conversas de preparação, com Ailton Krenak realizada na Semana do Bem Viver da Escola Parque do Rio de Janeiro, no dia 17 de junho de 2020. Disponível em: http://www.culturadobemviver.org/. Acesso em: 19 de janeiro de 2022.
KRENAK, Ailton. Ideias para adiar o fim do mundo. São Paulo: Companhia das Letras, 2019.
LASMAR, Cristiane. Mulheres indígenas: representações. Revista Estudos Feministas, vol. 7, nº 1 e 2, dossiê duplo Mulheres Indígenas, 1999.
ORTIZ, Renato. Cultura brasileira e identidade nacional. São Paulo: Braziliense, 1985.
PORTELA, Cristiane; NOGUEIRA, Mônica. Sobre indigenismo e autoria indígena no Brasil: novas epistemologias na contemporaneidade. Revista de História da Unisinos, v. 20, p. 154-162, 2016.
PREZIA, Benedito. História da resistência indígena: 500 anos de luta. São Paulo: Expressão Popular, 2017.
RENZULLI, Vinícius. Os múltiplos devires do “Pensamento Indígena”. In: Multiversidade da Floresta. Publicado em 21 de março de 2021. Disponível em: https://multiversidadedafloresta.com/2021/03/21/example-post-2/. Acesso em: 19 jan. 2022.
ROSA, Francis Mary Soares Correia da. Representações do indígena na literatura brasileira. In: DORRICO, Julie, et al. (Orgs). Literatura indígena brasileira contemporânea: criação, crítica e recepção. Porto Alegre: Editora Fi, 2018.
SAAVEDRA, Carola. Literatura e arte indígena no Brasil. Veredas: Revista da Associação Internacional de Lusitanistas. n. 33. p. 102–120, jan./jun., 2020.
SAAVEDRA, Carola. O mundo desdobrável: ensaios para depois do fim. Belo Horizonte: Relicário, 2021.
SEGATO, Rita. Que cada povo teça os fios da sua história: o pluralismo jurídico em diálogo didático com legisladores. In: Direito. UnB - Revista de Direito da Universidade de Brasília, v. 1, n. 1, p. 65–92, 2014.
SILVA, Mário Augusto Medeiros. A descoberta do insólito: literatura negra e literatura periférica no Brasil (1960-2000). Rio de Janeiro: Aeroplano, 2013.
SWAIN, tania navarro. As heterotopias feministas: espaços outros de criação. Labrys - Estudos feministas, n 3, janeiro/julho, 2003.
TERENA, Luiz Eloy; GUAJAJARA, Sônia. Povos indígenas e a luta pela vida: retrospectiva 2021. Disponível em: https://www.n-1edicoes.org/povos-indigenas-e-a-luta-pela-vida-retrospectiva-2021-1. Acesso em: 19 jan. 2022.
VIEIRA, Nanah; ALMEIDA, Tânia. Reescrevendo histórias e inscrevendo-se no território acadêmico: as indígenas mulheres frente à violência nas universidades brasileiras. In: ALMEIDA, Tânia; ZANELLO, Valeska. (Orgs.). Panoramas da violência contra mulheres nas universidades brasileiras e latino-americanas. Brasília: OAB Editora, 2022.
Este trabalho está licenciado sob uma licença Creative Commons Attribution-NonCommercial-ShareAlike 4.0 International License.
Copyright (c) 2022 Nanah Sanches Vieira, Tânia Mara Campos de Almeida, Vitor Coelho Camargo de Melo