Resumo
A partir das reflexões de estudiosos como A. Barchiesi (2010), G. B. Conte (2010), D. Fowler (2001) e P. S. Vasconcellos (2001; 2011), que se dedicaram no campo dos Estudos Clássicos a investigações sobre intertextualidade e alusão na literatura latina, este trabalho pretende explorar alguns desdobramentos desse recurso poético, isto é, o jogo alusivo, em traduções de obras que dele lançam mão, bem como certos desafios que tal recurso impõe ao tradutor. Para esse fim, pretende-se discutir um trecho da Ars Amatoria de Ovídio em que o autor alude a uma de suas próprias elegias, Amores III, 2. Meu argumento é de que a retomada da elegia dos Amores nesta passagem da Ars Amatoria cumpre o propósito de construir a persona ovidiana de praeceptor amoris, sendo, assim, de suma importância que se leve isto em consideração na tradução do poema. Na última seção do texto, discutem-se alguns desafios que uma tradução assim elaborada encontrará, e em seguida apresento minha proposta de tradução para o trecho.Referências
ALFARO, M. J. M. Intertextuality: origin and development of the concept. Atlantis, Vol. 18, No. 1/2, 1996, pp. 268-285.
ALLEN, G. “Introduction”; “Origins: Saussure, Bakhtin, Kristeva”. Intertextuality. London: Routledge, 2000, pp. 1-60.
BAKHTIN, M. (1969) Estética da criação verbal. Trad. Paulo Bezerra. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2011.
BAKHTIN, M. Problemas da poética de Dostoiévski. 2ª ed. Tradução de Paulo Bezerra. Rio de Janeiro: Forense Universitáris, 1997.
BARCHIESI, A. Otto punti su una mappa dei naufragi, MD, 39, 1997, pp. 209-226.
BARCHIESI, A.; CONTE, G. (1989). “Imitação e arte alusiva: modos e funções da intertextualidade.” In: CAVALLO, G.; FEDELI, P.; GIARDINA, A. (orgs.). O espaço literário da Roma Antiga. Tradução Daniel P. Carrara; Fernanda M. Moura. Belo Horizonte: Tessitura, 2010, pp. 87-121.
BARROS, D. L. P. de (org). Dialogismo, Polifonia, Intertextualidade. São Paulo: Edusp, 1994.
BENJAMIN, W. (1921). A tarefa do tradutor. In: GAGNEBIN, Jeanne Marie (Org.). Escritos sobre mito e linguagem (1915-1921). Trad. Susana Kampff Lages. São Paulo: Duas Cidades; Ed. 34, 2011b, pp. 101-119.
BERMAN, A. (1955) A prova do estrangeiro. Trad. Maria Emília Pereira Chanut. Bauru: Edusc, 2002.
BRITTO, P. H. A tradução literária. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2012.
BROWN, H. M. Emulation, Competition, and Homage: Imitation and Theories of Imitation in the Renaissance. Journal of the American Musicological Society, Vol. 35, No. 1, 1982, pp. 1-48.
CAIRNS, F. (1972). In Medias Res; The Antiquity and Development of the Genres. Generic Composition in Greek and Roman Poetry. Ann Arbor: Michigan Classical, 2001, pp. 3-69.
CAMPOS, H. de. Transcriação. TÁPIA, Marcelo; NÓBREGA, Thelma M.; (Org.). São Paulo: Perspectiva, 2013.
CARVALHO, R. Tradução de poesia latina clássica: uma tradição sempre renovada. Revista Letras, n. 89, Jan/Jun 2014. Curitiba: Editora UFPR, 2014, pp. 105-116.
CONTE, G. B. An Interpretation of the Tenth Eclogue. In: SEGAL, Charles (ed.) The Rhetoric of Imitation: Genre and Poetic Memory in Virgil and Other Latin Poets. Cornell Studies in Classical Philology Vol. 44. Ithaca: Cornell University Press, 1986, pp. 100-129.
CONTE, G. B. Memoria dei poeti e sistema letterario: Catullo, Virgilio, Ovidio, Lucano. Palermo: Sallerio Editore, 2012.
DAVIS, J. T. Dramatic and Comic Devices in Amores 3, 2. Hermes, 107 Bd., H. 1. Franz Steiner Verlag, 1979, pp. 51-69.
DUQUE, G. ‘Tu mihi sola places’: sobre um caso de alusão na Ars Amatoria de Ovídio. Letras em Revista. Mestrado Acadêmico da Universidade Federal do Piauí: Teresina, 2016.
EDMUNDS, L. Intertextuality and the reading of Roman poetry. Baltimore: The John Hopkins University Press, 2001.
FEDELI, P. (1989) As interseções dos gêneros e dos modelos. In: CAVALLO, G.; FEDELI, P.; GIARDINA, A. (orgs.). O espaço literário da Roma Antiga. Trad. Daniel P. Carrara; Fernanda M. Moura. Belo Horizonte: Tessitura, 2010, pp. 393-416.
FLORES, G. G. Elegias de Sexto Propércio. Belo Horizonte: Autêntica, 2014.
FOWLER, D. On the shoulders of giantes: Intertextuality and Classical Studies. Materiali e discussioni per l’analise dei testi classici. Nº 39. Fabrizio Serra Editore, 1997.
GIBSON, R. K. (Ed.) Ars Amatoria: Book 3. Cambridge: Cambridge University Press, 2003.
GRIMAL, P. (1951) Diccionario de mitologia Griega y Romana. Trad. Pedro Pericay. Barcelona: Ediciones Paidos, 1982.
HENDERSON, J. A Doo-Dah-Doo-Dah-Dey at the races: Ovid Amores 3.2 and the personal politics of the Circus Maximus. Classical Antiquity, Vol. 21, No. 1, 2002, pp. 41-65.
HINDS, S. Allusion and intertext: dynamics of appropriation in Roman poetry. Cambridge: Cambridge University Press, 1998.
HOLLIS, A. S. (Ed.). Ars Amatoria: Book 1.Oxford: Clarendon Press, 1977.
HOLZBERG, N. Ovids erotische Lehrgedichte und die römische Liebeselegie. Wiener Studien, Vol. 94, 1981, pp. 185-204.
HOMERO. Ilíada. Edição bilíngue Vol. 1 e 2. Tradução de Haroldo de Campos. São Paulo: Benvirá, 2003.
HOMERO. Odisseia. Edição bilíngue. Tradução, posfácio e notas de Trajano Vieira. São Paulo: Editora 34, 2011.
JAKOBSON, R. (1960). Aspectos lingüísticos da tradução. In: Lingüística e Comunicação. Trad. Izidoro Blikstein e José Paulo Paes. São Paulo, Cultrix, 1977.
JULIANI, T. J. Vestígios de Ovídio em Sobre as mulheres famosas (De Mulieribus Claris, 1361-1362) de Giovanni Boccaccio. Tese de Doutoramento. Universidade Estadual de Campinas - Instituto de Estudos da Linguagem, 2016.
KELLY, S. T. The Gallus quotation in Vergil's tenth Eclogue. Vergilius, No. 23, 1977, pp. 17-20.
KRISTEVA, J. (1969). Word, Dialogue, and Novel. In: Desire in Language: a Semiotic Approach to Literature and Art. Transl. Thomas Gora; Alice Jardine; Leon S. Roudiez. New York: Columbia University Press, 1980, pp. 64-91
MATEDI, J. P. Elegias de Tibulo: tradução e comentário. Tese de Doutoramento. Universidade Federal do Espírito Santo, 2014.
MESCHONNIC, H. Poética do traduzir. Trad. Jerusa Pires Ferreira e Suely Fenerich. São Paulo: Perspectiva, 2010.
NETTO, A. B. Antropofagia oswaldiana: um receituário estético e científico. São Paulo: Anablume, 2004.
NOUSS, A. Un bilan de 40 ans de traductologie: entrevue avec Alexis Nouss. Raceuillis par Salah Basalamah. Global Media Journal – édition canadienne. Vol. 5, n. 1, 2012, pp. 29-37.
OLIVA NETO, J. A. O hexâmetro datílico de Carlos Alberto Nunes: teoria e repercussões. Revista Letras, n. 89, Jan/Jun 2014. Curitiba: Editora UFPR, 2014, pp. 187-204.
OVÍDIO. Fastos. GOUVÊA JÚNIOR, Márcio Meirelles (trad.) Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2015.
PASQUALLI, G. Arte allusiva. In: Pagine stravaganti. Firenze: Sansoni, 1968, v. II.
PIGMAN, G. W. Versions of Imitation in the Renaissance. Renaissance Quaterly, Vol. 33, No. 1, pp. 1-32.
ROSS, D. O. Backgrounds to Augustan poetry: Gallus, elegy, and Rome. New York: Cambridge University Press, 1975.
ROUDIEZ, L. Introduction. In: KRISTEVA, Julia. Desire in Language: a Semiotic Approach to Literature and Art. Transl. Thomas Gora; Alice Jardine; Leon S. Roudiez. New York: Columbia University Press, 1980, pp. 1-22.
SHARROCK, A. Ovid and the discourses of love: the amatory works. In: HARDIE, Philip (ed.). The Cambridge Companion to Ovid. Cambridge: Harvard University Press, 2002, pp. 150-162.
TÁPIA, . Questões de equivalência métrica em tradução de poesia antiga. Revista Letras. Nº 89, Jan/Jun 2014. Curitiba: Editora UFPR, 2014, pp. 205-221.
THAMOS, M. Do hexâmetro ao decassílabo – equivalência estilística baseada na materialidade da expressão. Scientia Traductionis, n. 10, 2011, p. 201-213.
TREVIZAM, M. A elegia erótica romana e a tradição didascálica como matrizes compositivas da Ars Amatoria de Ovídio. Dissertação de Mestrado em Linguística, Campinas: Unicamp, 2003.
VASCONCELLOS, P. S. de. Reflexões sobre a noção de arte alusiva e intertextualidade na poesia latina. Clássica, v. 20, São Paulo: Universidade de São Paulo, 2011, pp. 239-260.
VIRGÍLIO. Bucólicas. Trad. Raimundo Carvalho. Belo Horizonte: Crisálida, 2005.
WILKINSON, L. P. Ovid Recalled. Cambridge: Cambridge University Press, 1955.
YARDLEY, J. C. Gallus in "Eclogue" 10: quotation or adaptation?. Vergilius, No. 26, 1980, pp. 48-51.
YUSTE FRÍAS, J. Au seuil de la traduction: la paratraduction. In: NAAIJKENS, T. (Ed.) Event or Incident. On the Role of Translation in the Dynamics of Cultural Exchange. Bern; Berlin; Bruxelles; Frankfurt; New York; Oxford; Wien: Peter Lang, vol. 3, 2010, pp. 287-316.