Pode-se pensar que o surgimento de uma nova doença seja um fato que, da maneira mais
rápida possível, tem o potencial de pautar as manchetes dos principais jornais e revistas de uma
cidade. Foi o que vimos com a pandemia de covid-19. Mas, em 1918, os tempos eram outros e
não foi bem o que aconteceu com a chamada “gripe espanhola”.
A compreensão sobre seu surgimento é um mistério que ainda persiste. No segundo
semestre de 1918, as manchetes e as principais notícias que circulavam diziam respeito às
batalhas finais da Grande Guerra. A entrada de um novo assunto pelos impressos se deu aos
poucos. As primeiras notícias sobre a nova doença foram, praticamente, ignoradas.
Uma das controvérsias sobre o significado da “gripe espanhola” diz respeito ao nome
que ela recebeu. Schwarcz e Starling (2020) sintetizaram a explicação que se tornou comum e
foi apresentada, inclusive, pela documentação. A Espanha, por ser o país que primeiro divulgou
e noticiou a nova doença, recebeu a marca de tê-la originado, comprovação jamais efetivada.
Fato é que a imprensa brasileira, principalmente os jornais de São Paulo e do Rio de
Janeiro, passaram a adotar este nome em suas matérias jornalísticas. A dinâmica de se querer
encontrar possíveis culpados e autores para o surgimento de uma nova mazela sempre foi
comum na história das doenças, sejam eles países ou pessoas. Não foi diferente na pandemia
de influenza e, no caso, a Espanha se internacionalizou como a protagonista para o surgimento
de um malefício pelo qual não fora responsável, se é que algum foi: “Designar uma doença com
o nome do inimigo ou do estrangeiro é algo que se repete pelo menos desde a Idade Média,
apesar de constituir um modo covarde de aponto o outro como culpado pelo mal e acusá-lo de
semear o contágio” (SCHWARCZ; STARLING, 2020, p. 14).
Assim, o que se constatou na história da pandemia de 1918 foram as tentativas de
fornecer uma explicação plausível para o surgimento da manifestação de uma moléstia que já
era conhecida, a influenza, mas que assumia características distintas de suas outras
manifestações já conhecidas. A diferença que se observou, no caso de 1918, era o
desconhecimento dos motivos responsáveis por aquela manifestação se apresentar tão
contagiosa e provocar tantas mortes. A virulência daquela forma de gripe foi uma situação
surpresa que abalou o mundo justamente no momento em que a Grande Guerra se encerrava.
A partir da leitura das notícias dos jornais e das revistas daquela época, ao se pensar
sobre o entendimento a respeito da influenza, observa-se que as concepções das medidas
profiláticas a serem adotadas, assim como a própria terminologia “pandemia”, vão sendo
construídas ao longo da sucessão dos eventos que marcaram os anos de 1918 e 1919. De igual
maneira, a ideia de “vírus” como sendo o agente causador da doença, embora já houvesse
estudos sobre isso, não era amplamente divulgado e conhecido. Diante deste contexto,