desespero. Por mais pavorosa que ela seja, não se poderia dizer que a história
transcorreu em vão e não trouxe o menor benefício. O que fazer se, por
natureza, o homem é condenado a abrir caminho por entre os horrores e os
sofrimentos para passas das trevas à razão e de sua animalidade à sua
humanidade! Após uma longa sequência de erros históricos e seus
inseparáveis males, as massas ignorantes pouco a pouco aglomeraram-se. Foi
necessário que pagassem com suor, sangue, miséria, fome, trabalho servil,
sofrimentos e hecatombes todo movimento no qual as arrastava sua minoria
de exploradores. Na falta de livros, que elas não teriam sabido ler, foi sobre a
própria pele que a história foi escrita. Tais lições não se esquece. Pagando tal
preço por toda nova crença, esperança ou erro, as massas populares chegam,
malgrado asneiras históricas, à razão. (idem, p. 55).
A razão, como forma de combate representa o povo oprimido pelo trabalho, pela
preocupação com a existência mediante formas corrompidas de trabalho e, ainda, pela condição
política e material que o condena à ignorância e à impossibilidade de fruir conhecimento e razão
a seu favor, como salienta Bakunin. Assim, propõe-se que a luta social se faz, entre muitas
ações, não ancorada nos meios de estatização das classes trabalhadoras e apropriação das
mesmas estruturas de dominação que lhes afeta. No meio anarquista, a luta social se faz pela
luta cultural, a luta em busca do saber e da autonomia intelectual, que necessita de ser, por eles
mesmos, difundida como bem coletivo e social:
À medida que a inteligência e a energia das classes declinam, cresce a
inteligência do povo, depois sua força. No povo, qualquer que seja a lentidão
da evolução, e ainda que a instrução pelo livro seja-lhe inacessível, o avanço
nunca para. Ele tem para si dois livros de cabeceira nos quais não cessa de
aprender: o primeiro é aquele de sua amarga experiência, de sua miséria, de
sua opressão, de suas humilhações, de sua espoliação e dos sofrimentos que
lhe infligem cotidianamente o governo e as classes; o segundo é aquele da
tradição, viva, oral, transmitida de geração a geração, e tornando-se cada vez
mais completa, mais sensata, mais vasta. (idem, p. 47).
Por esses motivos, a escola se tornou uma forma de coletividade tão importante e
presente no movimento anarquista, refletindo sua capacidade de promover o verdadeiro
progresso das massas e da sociedade, ou seja, o progresso que desvela o conhecimento do
monopólio estatal e religioso, valoriza a cultura como forma de propagação da palavra, da ideia
e da revolução social, e quer destruir aquilo que aniquila, de maneira coletiva, culturas, povos,
línguas, tradições, singularidades e história.