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Rev. Iberoam. Patrim. Histórico-Educativo, Campinas (SP), v. 9, p. 1-18, e023026, 2023.
ISSN 2447-746X
DOI: https://doi.org/10.20888/ridphe_r.v9i00.17380
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ESPAÇO CAIÇARA: PROJETO ESCOLAR EE SEBASTIANA MUNIZ PAIVA,
IGUAPE/SP - DOCUMENTAR UMA EXPERIÊNCIA
Paulo Cesar Franco
1
Associação dos Jovens da Juréia (AJJ), Brasil
pcfranco15@gmail.com
RESUMO
O presente artigo trata de documentar uma experiência sobre um projeto escolar intitulado
“Espaço Caiçara” realizado anualmente na Escola Estadual Sebastiana Muniz Paiva, Barra do
Ribeira, Iguape/SP. Objetiva divulgar os resultados das atividades de valorização e
continuidade da cultura caiçara. A metodologia utilizada no estudo, com base a pesquisa de
campo (Brandão, 2007), consiste no levantamento e compilação de dados coletados nas
vivências culturais que são apresentadas em forma de exposição na escola e na comunidade. As
vivências culturais, ações do projeto, são realizadas nas comunidades tradicionais caiçaras e
conta com uma comissão composta por gestores, estudantes, professores, pais de estudantes,
entidades locais e funcionários que estudam e pesquisam a Cultura Caiçara por meio de roteiros
pré-elaborados nos ATPCs, onde o projeto é discutido coletivamente. As informações coletadas
nas comunidades são transformadas em textos, registros fotográficos, peças teatrais, materiais
didáticos e são trabalhadas conforme as habilidades e competências presentes no currículo
paulista/BNCC. Normalmente, é realizada uma “Semana Caiçara” que conta com café caiçara,
casa caiçara, palestras, comunidades tradicionais, confecções de artesanatos, entre outros. Ao
final do projeto exposição nas salas de aulas para que a comunidade tenha acesso ao conteúdo
completo da pesquisa. A conclusão do projeto é confraternizada com a presença de diversos
tipos de comidas típicas caiçaras e agraciada com a moda do fandango.
Palavras-chave: Espaço Caiçara, Documentar Experiência, Projeto Cultural Escolar
FIGURA 1 O que é Cultura Caiçara?
Fonte: acervo pessoal.
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Doutorando do Programa de Pós-Graduação em Educação da FE/UNICAMP.
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INTRODUÇÃO
Para relatar a experiência do Espaço Caiçara, projeto educacional e cultural realizado
anualmente na Escola Estadual Sebastiana Muniz Paiva, em Iguape /SP, é necessário comentar
sobre os antecedentes que atuaram para a consolidação de tal iniciativa que começou em 2006
e se estende até os dias de hoje.
Em 1986, com a implantação da Estação Ecológica Juréia-Itatins/ EEJI, unidade de
conservação integral da natureza, criada pelo decreto 24.646 de 20/01/86, no governo Montoro
(SANCHES, 2004, p.81), foram impostas restrições ao uso da terra caiçara e frequentes
intimidações policiais que causaram a expulsão, segundo CASTRO, 2017, pelo cansaço, de
centenas de famílias tradicionais da Juréia, Iguape/SP, para as periferias das cidades do Vale
do Ribeira e Baixada Santista.
A expulsão pelo cansaço foi uma estratégia, adotada pela Secretaria do Meio Ambiente
do Estado de São Paulo adepta do “meio ambiente sem gente”, para que os caiçaras esvaziassem
o território de origem dando lugar a uma área de proteção na natureza que futuramente as
empresas da economia pudessem privatizar ao seus bel prazer.
LIDERANÇAS CAIÇARAS
As ações restritivas impostas pelas políticas ambientais, que retiravam as terras dos
caiçaras e interferiam na sua cultura, fizeram com que surgissem várias lideranças dentro do
território que não aceitavam tais injustiças contra suas comunidades tradicionais,
comprovadamente habitantes da região há mais de quatro gerações.
Nesse embate contra o governo, a partir de 1987, dialogando com as comunidades da
Juréia as lideranças conseguiram fundar a primeira associação do território caiçara que foi
intitulada “União dos Moradores da Juréia-UMJ
2
. A associação nasceu com objetivo de discutir
os direitos dos moradores locais. Mais adiante, em 1994, os jovens também expatriados da
Juréia, que foram morar na comunidade da Barra do Ribeira/Iguape, também se articularam
para fundar outra associação que veio a se chamar “Associação dos Jovens a Juréia-AJJ
3
”.
2
Disponível em: https://www.facebook.com/moradoresdajureia. Acesso em 02 de outubro de 2022.
3
A AJJ (associação dos Jovens da Juréia) é uma organização não governamental sem fins lucrativos criada no ano
de 1993 e inscrita como pessoa jurídica no dia 26 de abril de 1998, tem como objetivos principais a geração de
renda, resgate e manutenção da cultura caiçara e a permanência das comunidades da Juréia em suas terras. Acesso
em 29de abril de 2019. Link: https://ajjureia.wordpress.com/nossa-historia/.
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Nesse estudo abordaremos a atuação da AJJ.
A ASSOCIAÇÃO DOS JOVENS DA JURÉIA
O contexto, que antecede a fundação da AJJ, tem início em meados de 1986 quando as
famílias expatriadas da Juréia começaram a chegar na comunidade da Barra do Ribeira para
recomeçar a vida longe de seu território de origem. Na busca pela sobrevivência passaram a
fazer bicos, trabalhar em construção civil, praticar a pesca da manjuba, limpar casas de turistas
e realizar variados trabalhos braçais.
O contexto, pelo qual passavam as comunidades caiçaras, serviu de motivação aos
jovens para a fundação da AJJ. Distantes do território de origem, onde tinham contato com a
terra e a cultura tradicional, viam-se expostos a uma cultura urbanizada e ao crescimento do
turismo desordenado que crescia trazendo para o bairro um novo estilo de música, roupas e um
jeito de viver capitalista.
Referente a perda do território e da inversão de valores provocados pela expansão do
turismo desordenado, Diegues apresenta o seguinte posicionamento:
a política ambiental equivocada, que transforma os caiçaras em grandes devastadores
da natureza, e a especulação imobiliária, com a construção de casas de veraneio,
expulsando-os de suas terras são, a nosso ver, os processos sociais que mais atingem
o modo de vida caiçara, uma vez que leva a perda de seu território, como local de
reprodução social. Esses processos vieram acelerar, de maneira geral, o fluxo
migratório para as favelas das cidades litorâneas, iniciado anteriormente. (DIEGUES,
2005, p.313)
A restrição ambiental e a expansão desordenada do turismo contribuíram, e ainda
contribuem, para a desmotivação dos jovens, sobretudo os estudantes, no sentido de distanciá-
los da terra onde seus pais cultivavam a roça de subsistência, praticavam o mutirão e realizavam
o fandango caiçara. Essa desmotivação pela cultura local, por conta do distanciamento da terra,
contribuiu para que os jovens passassem a ter mais contato com os turistas que os influenciaram
a um novo estilo de vida.
Procurando refletir essa realidade, os jovens encontravam na AJJ espaço para organizar
a formação e lutar pelo território caiçara. Discutiam o direito à terra, compartilhavam a memória
do fandango, construíam a viola branca iguapeana e a rabeca (instrumentos do fandango
caiçara) e produziam artesanatos para geração de renda local.
O ambiente da AJJ atuava como uma escola popular, pois enquanto os anciãos
ensinavam a técnica da confecção da rabeca, viola branca e outros artesanatos da tradição
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caiçara, os jovens da Juréia debatiam coletivamente sobre a possibilidade de criação de uma
escola caiçara para ensinar às crianças a história da Juréia, os saberes e a identidade do território
caiçara.
ESCOLA CAIÇARA DA JURÉIA
Em 2000, após um árduo processo de discussão com todas as comunidades tradicionais
da Juréia, ongs parceiras, pesquisadores, poder público, foi fundada a Escola Caiçara da Juréia
na comunidade da Cachoeira do Guilherme, coração da Juréia (Melo, 2002), Iguape, por meio
de lei municipal.
A Escola Caiçara da Juréia funcionou de 2000 a 2004 e teve vínculo com a EE
Sebastiana Muniz Paiva e deliberação da Diretoria de Ensino da Região de Miracatu. O
histórico dessa experiência educacional foi relatado no livro “Escola Caiçara da Juréia”, que se
encontra disponível nas referências desse estudo.
Apesar da Escola Caiçara ter encerrado suas atividades educacionais na Cachoeira do
Guilherme, os ideais dela continuaram existindo na AJJ por meio das “Oficinas de Fandango
Caiçaras” que foi um projeto financiado pelo Ministério da Cultura-Minc e realizado em
parceria com a EE Sebastiana Muniz Paiva.
CENTRO DE CULTURA CAIÇARA
Em 2005, a AJJ foi contemplada pelo Ministério da Cultura-Minc, por meio dos editais
do Pontos de Cultura, e transformou-se num Centro de Cultura Caiçara para realizar “Oficinas
de Fandango Caiçaras” com apoio financeiro do Governo Federal. Turino (2010) definiu Ponto
de Cultura da seguinte forma:
Ponto de Cultura é um conceito de política pública. São organizações culturais
da sociedade que ganham força e reconhecimento institucional ao estabelecer
uma parceria, um pacto, com o Estado. Aqui uma sutil distinção: o ponto
de cultura não pode ser para as pessoas, e sim das pessoas; um organizador da
cultura no nível local, atuando com um ponto de recepção e irradiação de
cultura. Com um elo na articulação em rede, o Ponto de Cultura não é um
equipamento cultural do governo, nem um serviço. Seu foco não está na
carência, na ausência de bens e serviços, e sim na potência, na capacidade de
agir de pessoas e grupos. Ponto de Cultura em processo, desenvolvida com
autonomia e protagonismo social (TURINO, 2010. p. 64).
O Centro de Cultura Caiçara, sediada na AJJ e financiado pelo Governo Federal, por
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intermédio do Mistério da Cultura-Minc, deu visibilidade a Cultura Caiçara em um momento
que as políticas ambientalistas do governo paulista tentavam abafar os movimentos caiçaras em
seus territórios de origens.
CONHECENDO A COMUNIDADE DA BARRA DO RIBEIRA
A comunidade da Barra do Ribeira, onde está situada a EE Sebastiana Muniz
Paiva, unidade de ensino que realiza o Projeto Espaço Caiçara, está localizada nas proximidades
da foz do rio Ribeira de Iguape, no litoral sul do Estado de São Paulo. Na Barra do Ribeira
também está situada a Barra do Icapara e perto de ambas tem início o Complexo Lagunar
Iguape-Paranaguá. A Barra do Ribeira ainda serve como porta de entrada para a Estação
Ecológica da Juréia.
Em 2002, a pesquisadora da Unicamp, Alik Wunder, descreveu o bairro da
Barra do Ribeira da seguinte forma:
Chega-se até a Barra por uma estradinha de terra de 20 km que sai do centro
de Iguape, margeia a Ilha Comprida e acaba nas margens do largo leito do
Ribeira. Uma balsa faz a travessia e por ela avistam-se o mangue que margeia
o rio, os maciços da Jureia ao fundo, um horizonte confuso de junção de rio
com mar e o porto da vila. Os barcos descansam atracados, coloridos, alguns
homens pescam, gaivotas movimentam-se, todos na mesma mansa sintonia.
As embarcações são as únicas maneiras de entrada na vila. A balsa é a
passagem principal. Ela nos deixa no pequeno centrinho comercial. Os bares,
lojas, pequenos restaurantes abertos estão desertos a espera de turistas. Tudo
parece estar à espera. Há um vaguear lento dos homens pelas ruas, há poucos
turistas e não é época de muitos peixes. Ao sair da Balsa estamos na rua
principal da vila que, em quinze minutos de caminhada, nos leva ao mar
(WUNDER, 2002, p. 44).
Aconteceram algumas melhorias no bairro ao longo de duas décadas. A estrada que
acesso, por exemplo, foi asfaltada e o serviço da balsa ainda que não tenha mudado
estruturalmente, mesmo assim, recebeu algumas melhorias no serviço prestado. Outros olhares
do lugar como o mangue, os portos de pesca e o vaguear lento dos homens continuam
inalterados.
No percurso em direção ao mar, em frente a um campo de futebol está situada a EE
Sebastiana Muniz Paiva. Nela estudam aproximadamente 150 alunos, do Ensino Fundamental
II e Ensino Médio, dentre residentes do bairro e advindos de comunidades rurais.
Os estudantes que moram nas comunidades rurais chegam à escola por meio de barco
ou de kombi. O barco faz o transporte pelo rio Ribeira e a kombi traz os estudantes pela praia
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da Juréia, por onde percorrem uma distância de aproximadamente 15km. Em períodos
chuvosos, quando a maré fica bastante agitada, os estudantes são impossibilitados de frequentar
as aulas, uma vez que a kombi não consegue trafegar pela praia ou por uma estrada precária de
terra que faz a ligação entre a escola e a comunidade.
A parceria entre AJJ e Escola Sebastiana deu visibilidade e potencializou,
consideravelmente, o trabalho com a cultura caiçara tanto no âmbito educacional como no
cultural.
A PARCERIA ENTRE AJJ E ESCOLA SEBASTIANA
A consolidação da parceria, entre AJJ e EE Sebastiana Muniz Paiva, permitiu que as
“Oficinas de Fandango Caiçara” promovessem importantes reflexões no ambiente escolar que
aos poucos foram sendo acatadas pela gestão escolar e levadas para as reuniões das Atividades
de Trabalhos Pedagógicos Coletivos ATPCs, de onde surgiu a ideia de incorporar o conceito
caiçara no Projeto Político Pedagógico PPP.
BARRA DO RIBEIRA PELO OLHAR DA SEBASTIANA
A iniciativa intitulada “Barra do Ribeira pelo Olhar da Sebastiana” inaugurou o processo
de criação do projeto “Espaço Caiçara”. Inicialmente, consistiu no “olhar” e no pesquisar os
saberes presentes no bairro, olhava-se para a história da fundação do bairro, a implantação da
balsa que faz a travessia, a pesca da manjuba, o tecimento das redes de pesca, a construção de
canoas de madeira e outros tantos olhares sobre a cultura local. Aos poucos, e timidamente, o
projeto foi chamando a atenção da gestão escolar e dos professores, sobretudo pelo engajamento
dos estudantes e a possibilidade de resgatar a memória de trabalhos anteriores referentes à
temática caiçara.
A “Barra do Ribeira pelo Olhar da Sebastiana” foi uma iniciativa de olhar o bairro e
tatear o ser caiçara. Algumas visitas que aconteceram com os estudantes nos “fundos” de
quintais de mestres artesãos, com objetivo de conhecer as oficinas de confecção de viola branca
e rabeca, suscitou alguns questionamentos: Por que os mestres fazem seus instrumentos
escondidos? Por que não os levam à escola para ensinar os estudantes?
Os questionamentos potencializaram as “Oficinas de Fandango Caiçara” que passaram
a acontecer com mais frequências nas escolas e no Centro de cultura Caiçara. Esse movimento
de levar o conhecimento (saber de experiência) dos artesãos dos fundos de seus quintais para
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escola iniciou o processo de visibilidade do conceito caiçara e da identidade local.
SIRI NA LATA
A partir de 2007, o “Barra do Ribeira pelo Olhar da Sebastiana” é reformulado no seu
estilo de realização e passa a ser chamado “Siri na Lata
4
”. Essa nova denominação diz respeito
aos questionamentos levantados pelos estudantes referentes a estrutura escolar. As salas de
aulas careciam de reformas das lousas, de instalação de ventiladores, de manutenção das portas,
entre outras melhorias. Outrossim, reivindicavam inovação quanto à metodologia de ensino
para que o ato de aprender fosse mais prazeroso.
Queriam aulas fora da escola, pois a realidade escolar naquele momento estava sendo
comparada como um “siri na lata”, ou seja, estavam se sentindo “presos” na escola.
Diante de tal contexto, os jovens da Juréia propuseram, em reunião de ATPC, a
realização de uma “Vivência Cultural Caiçara” na comunidade tradicional do Pereirinha, no
município vizinho de Cananéia/SP. O objetivo de tal vivência era proporcionar aos estudantes
experiências extraescolares que ampliassem o conhecimento sobre a Cultura Caiçara e os
motivasse a melhorar seus estudos e comportamentos dentro e fora da escola.
A “Vivência Cultural Caiçara” foi organizada pelos jovens da Juréia, por meio do
Centro de Cultura Caiçara que disponibilizou o transporte e alimentação para levar os
estudantes do Ensino Médio, da EE Sebastiana Muniz Paiva, até a cidade de Cananéia.
Na cidade de Cananéia, onde aconteceu o evento, os estudantes tiveram a oportunidade
de conhecer o museu local, onde está exposto o famoso “Tubarão Branco” pescado no costão
da Juréia, e a história da cidade onde viveu o lendário Bacharel de Cananéia.
Além de conhecerem os casarios que compõe o Centro Histórico da cidade e
caminharem pela Orla do Mar Pequeno, visitando os canhões expostos na praça Martim Afonso
de Souza e admirarem a igreja local, cujas janelas fogem do padrão tradicional.
Após conhecerem os pontos turísticos e históricos da cidade, os estudantes seguiram de
escuna para a comunidade caiçara do Pereirinha que está localizada na Ilha do Cardoso. Durante
a viagem de escuna puderam observar os golfinhos que se aproximaram da embarcação, para
encantamento e admiração de todos. Na comunidade, houve, além de caminhada por trilhas e
praias, a realização de palestras com monitores caiçaras que ensinaram sobre o modo de vida
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Siri na lata é uma expressão caiçara que significa “estar preso”. Era essa a sensação dos estudantes em sala de
aula em dia de calor.
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na ilha.
A “Vivência Cultural Caiçara” foi avaliada positivamente pela gestão escolar,
professores e estudantes, tanto do ponto de vista do conhecimento cultural como do aspecto
engajador e revigorador que a vivência pôde proporcionar.
FILOSOFIA NOS VERSOS DO FANDANGO CAIÇARA
Em 2008, a parceria entre AJJ e escola Sebastiana procurou explorar o fandango caiçara
a partir do aspecto poético-filosófico do tema. Mudava-se mais uma vez a intitulação da
iniciativa passando a ser chamada de “Filosofia nos Versos do Fandango Caiçara”. O objetivo
era explorar a potência poética do fandango e trabalhar com os estudantes as composições dos
mestres fandangueiros bem como instigar as produções e pesquisas a partir da filosofia poética
local.
Atrelada à pesquisa das letras compostas pelos fandangueiros da Juréia, os estudantes
se aprofundaram no estudo do fandango por meio de artigos científicos.
Pesquisando sobre a sabedoria dos mestres fandangueiros e suas técnicas de compor os
versos das canções, os estudantes avançaram no estudo do fandango por meio da pesquisadora
Calu Rodrigues (2006) que afirma:
o fandango representa um tempo ou um lugar onde estas pessoas podem ser o
que são, se reconhecem e reconhecem nos parceiros e parceiras seu mesmo
modo de vida e a mesma visão de mundo. Parece ser o momento em que
podem compartilhar dos mesmos valores, costumes, problemas, sonhos,
expectativas. (RODRIGUES, 2013, p. 199)
Ainda nesse sentido, os estudantes ficaram sabendo por meio das pesquisadoras Corrêa
& Gramani (2006) que o fandango “[...] é uma manifestação cultural popular que reúne dança
e música e possui regras estéticas definidas. Em cada localidade, entretanto, existem
características especificas, criando assim uma realidade artística rica e variada (CORRÊA;
GRAMANI, 2006, p. 21).
No que diz respeito à estrutura poética do fandango, ainda de acordo com Corrêa &
Gramani (2006),
as modas tratam de temas diversos. Muitas delas falam sobre animais e
elementos da natureza, outras abordam questões relacionadas ao cotidiano
caiçara. as que se referem a acontecimentos locais e eventos históricos. [...]
A estrutura poética das modas de fandango também é variada. A rima é uma
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constante, mas aparece de diferentes formas. Algumas modas não possuem
refrão e são compostas apenas de versos adaptados a melodia [...] (CORRÊA;
GRAMANI, 2006, p. 23).
Constituindo um tema gerador, a temática do fandango abriu caminho para
que professores e estudantes iniciassem um diálogo com a cultura caiçara mais constante e
familiar, com entrevistas com mestres caiçaras, pesquisas em bibliotecas, palestras com
professores pesquisadores e contato com poesias, que passaram a fazer parte do cotidiano
escolar.
A poesia intitulada “Moda Caiçara”, escrita por um ex-educando da EE
Sebastiana Muniz, mostrava, naquele momento, a percepção de um jovem caiçara sobre a sua
cultura.
Moda Caiçara
Paulistano quer comer peixe,
No mercado ele procura.
Caiçara agarra na vara,
E sai pela noite, às escuras.
Paulistano fica doente,
Vem logo o doutor e cura.
Caiçara fica doente,
O remédio é sepultura.
A perna da paulista,
É bonita e tem grossura.
Cambito da caiçara,
Ainda perde pra saracura.
Paulistano levanta cedo,
Toma café com mistura.
Caiçara bebe garapa,
Quase sempre sem doçura.
A roupa do paulistano
Fazenda boa que dura.
O trapo do caiçara,
É só remendo e costura.
(Pablo Henrique Martins, 2008, 1ªE.M)
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Os primeiros resultados das produções poéticas revelaram um olhar depreciador dos
educandos em relação ao “Ser caiçara”. Um olhar que mostrava o distanciamento deles em
relação ao território, local onde seus pais e avós mantinham contato com a terra, onde
construíam suas vidas, pertencimento e valorização identitária.
Outra questão levantada na poesia é a comparação que eles faziam entre o caiçara e
aquele que vem de fora. O turismo que chega ao bairro e com ele a inversão de valores,
consequentemente, introduz o sentimento de inferioridade diante do desconhecimento da
tradição local.
Os professores trabalharam a contextualização do bairro e da cultura caiçara analisando
as mudanças conceituais através da poesia e relacionaram com o trabalho que a AJJ fazia no
empoderamento da juventude.
Em outra poesia observa-se um ex-aluno expressar poeticamente o sentimento de
valorização pelo lugar em que nasceu, pois a continuidade do trabalho de relacionar a filosofia,
poesia e cultura caiçara foi proporcionando reflexões, conquistando espaço dentro e fora da
escola e conscientizando os jovens quanto à importância de sua identidade.
Jureia Querida
Um pequeno vilarejo,
Rodeado por belezas onde,
As águas do rio se encontram,
E as do mar esbravejam.
Uma grande cultura,
Músicas e violeiros;
O dia é atração,
A noite é festejo.
Suas belezas incomparáveis,
Seu povo hospitaleiro,
Sua cultura intocável,
Seu trabalho pesqueiro.
Oh, Jureia!
Terra de imortais,
Seus encantos me fascinam
E daqui não saio jamais.
(Erick Ripari, 2008, 2ªE.M)
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A segunda poesia mostra o ex-educando valorizando sua cultura e seu lugar. São versos
que superam e refletem o reconhecimento em relação à sua identidade. Percebe-se que na
construção poética a conceituação do lugar vem acompanhada de adjetivos que valorizam o
território e a convicção de querer ficar no bairro onde nasceu.
A iniciativa “Filosofia nos Versos do Fandango Caiçara” potencializa, por meio das
atividades com poesias, a reflexão coletiva de estudantes que começam a relacionar a história
do bairro com a história pessoal.
Assim, a segunda poesia expressa o resultado da reflexão identitária fazendo com que o
estudante mergulhe na sua subjetividade de valores familiares, históricos de onde emerge o
diálogo entre seu interior e o mundo, ou seja, é deste buscar que se inaugura o diálogo da
educação como prática da liberdade(FREIRE, 1987, p.87).
No final de 2008, a AJJ conseguiu promover outra Vivência Cultural em comunidade
tradicional do Vale do Ribeira. Dessa vez, foi no Quilombo de Ivaporunduva, no município de
Eldorado/SP, próximo à Caverna do Diabo, referência turística do Vale do Ribeira. A vivência
teve como objetivo conhecer o modo de vida quilombolas na prática e por meio dela relacionar
a filosofia poética caiçara com a arte negra de trabalhar terra, confeccionar os artesanatos,
contar suas histórias e identificar o termo comum das origens caiçaras e negras no processo de
formação do Brasil.
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FIGURA 2 Apresentação de fandango
Fonte: acervo pessoal.
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A partir de 2009, a parceria entre AJJ e EE Sebastiana passa a não contar mais com o
financiamento do Ministério da Cultura-Minc. O contrato do Governo Federal com a AJJ foi
cessado. O Centro de Cultura da Barra do Ribeira reduziu suas atividades. A parceria continua
com ações pontuais e voluntarias por parte dos Jovens da Juréia.
No ano de 2010 uma nova configuração do projeto entra em vigor. O termo Espaço
Caiçara” assume definitivamente a denominação que perdura aos dias atuais. O professor de
geografia, Otoniel Trudes, teve uma participação significativa no processo de intitulação e
remodelação do projeto. Junto a ele, atuaram o professor Edielson Groppo, as professoras
Aparecida Mâncio e Daniela Pace Devisate, além de educadores não efetivos que trabalharam
na escola. A equipe gestora, funcionários da secretaria, cozinha, limpeza e agentes de
organização escolar também foram atuantes.
O projeto “Espaço Caiçara”, propriamente dito, teve continuidade por meio da criação
de uma “Comissão do Espaço Caiçara-CEC
5
que objetivava adequar o projeto conforme as
normas da BNCC e incluir a proposta no Projeto Político Pedagógico-PPP da escola.
Assim, a CEC elaborou uma problemática para direcionar o desenvolvimento do projeto
que consistia na seguinte questão: De que forma se deve trabalhar a temática da Cultura Caiçara
para que se possa dialogar com as orientações da BNCC, lidar com as indisciplinas e melhorar
o rendimento escolar?
Diante da questão apresentada, a CEC elaborou um plano anual de gestão fundamentada
em metodologia que desse direcionamento à realização do projeto. Fundamentando-se em
Brandão (2006), mais precisamente na concepção de pesquisa participante, houve o seguinte
direcionamento:
conhecer a sua própria história. Participar da produção deste conhecimento e
tomar posse dele. Aprender a escrever a sua história de classe. Aprender a
reescrever a História através da sua história. Ter no agente de pesquisa uma
espécie de gente que serve. Uma gente aliada, armada dos conhecimentos
científicos que foram sempre negados ao povo, àqueles para quem a pesquisa
participante-onde afinal pesquisadores-e-pesquisados são sujeitos de um
mesmo trabalho comum, ainda que com situações e tarefas diferentes-pretende
ser um instrumento a mais de reconquista popular (BRANDÃO, 2006, p.11.).
Com base metodológica nos registros de campo, o projeto começou pesquisando as
entidades do bairro para a compreensão de seus objetivos e conhecer as experiências que foram
bem-sucedidas.
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Neste artigo, adotarei o termo “Comissão do Espaço Caiçara-CEC” para designar a equipe gestora do projeto
“Espaço Caiçara” e usarei como referência a abreviação CEC.
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A experiência, que foi proporcionada com a pesquisa sobre as instituições do bairro,
produziu expectativa e gerou o seguinte questionamento: Qual seria o resultado do “Espaço
Caiçara” acontecer nas comunidades do entorno da escola? As atividades contemplariam o
objetivo do projeto?
Entre 2011 e 2018 o “Espaço Caiçara” realizou atividades nas comunidades caiçaras,
adjacentes à escola, com objetivo de possibilitar experiências significativas que dessem sentido
aos estudantes naquilo que se passa, que se toca, “que acontece ao longo da vida e no modo
como vamos dando sentido ao acontecer do que nos acontece” (LARROSA, 2004, p.20).
Buscava-se, com a experiência de campo, a possibilidade do estudante sentar em volta
de um fogão à lenha e tomar o café caiçara junto a família tradicional, visitar as roças de
mandioca, dançar fandango, produzir e comer bijus de goma, ouvir estórias de um mestre
caiçara na comunidade. O local escolhido para tal experiência foi a comunidade tradicional do
Prelado, localidade distante 15 km da escola Sebastiana. As experiências, que cada estudante
vivenciou, produziram marcas subjetivas significativas em suas vidas. Marcas que despertaram
olhares inéditos sobre o lugar, o outro, a existência. Marcas que instauram aberturas para uma
nova possibilidade de pensar o ser caiçara conforme salienta Rolnik,
[...] marcas são exatamente estes estados inéditos que se produzem em nosso
corpo, a partir das composições que vamos vivendo. Cada um desses estados
constitui uma diferença que instaura uma abertura para criação de um novo
corpo, o que significa que as marcas são sempre gênese de um devir
(ROLNIK, 1993, p.02).
Permitir o novo significa pensar e acreditar numa gestão escolar que ultrapasse os muros
da escola e se liberte das amarras dos currículos engessados que o governo propõe e o diário
oficial decreta. Pensando assim, a gestão escolar possibilita o voo da mente e a liberdade do
corpo aos estudantes para que sejam afetados por marcas que carreguem pela vida.
Em 2018, a Vivência Caiçara” promovida pelo projeto deslocou estudantes,
professores e toda equipe escolar para diversas partes das comunidades adjacentes à escola.
Nesse movimento, de saída da escola em direção às comunidades, foi possível o estudo da
geografia local, cultura, história e outros tantos aspectos do território caiçara. Nesses
deslocamentos entraram em cena o processo da fabricação da farinha de mandioca, a construção
dos cestos, da canoa de um pau só e de tantos outros artefatos locais. Os olhares, as impressões
e cada experiência vivida foram registradas por meio de questionário (parte do roteiro elaborado
na escola) para levantamento de dados que foram compilados em materiais didáticos que
fortaleceram os exercícios das competências e as habilidades da BNCC.
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SEMANA CAIÇARA
A conclusão da pesquisa de campo e exposição do resultado se deu durante a Semana
Caiçara. Os materiais compilados foram transformados em revistas, quadros, maquetes e outros
tipos de exposições que integraram o evento escolar. Além da exposição, também foram
realizados palestras, oficinas, teatros e apresentações de vídeos que refletiu sobre o caiçara. O
cronograma do projeto “Espaço Caiçara” de 2018 foi registrado no quadro abaixo.
TABELA 1 Programação da Semana Caiçara (Projeto “Espaço Caiçara”)/dezembro de
2018
Dia 04
(Terça-feira)
Dia 05
(Quarta-feira)
Dia 06 (Quinta-feira)
8h Abertura
do projeto
(Aberto ao
público)
8h Abertura
do dia
(Vivência no
Clube Aquários)
(Para
estudantes)
8h Abertura do dia
(Vivência no Ribeira) -
parceria com o DERSA e
Unesp/Registro)
(Para estudantes)
8h15 Café
8h15 - Café
8h15 Café
9h Palestra:
"Iguape: 480
anos de muita
história"
(Roberto
Fortes)
9h15 Saída da
balsa para o
clube Aquários
8h30 Palestra sobre
cooperativismo e a pesca
artesanal em Iguape (Darci de
Jesus e José Mário de Souza
Fortes)
10h
Apresentação
(Lara/
Batucajé),
oficina de
confecção de
covo (Sr.
Carlos
Raymundo),
confecção de
balaio (Valter
Lima) e roda
de conversa
com
moradores da
Barra do
Ribeira
10h - Músicas,
jogos, piscina,
brincadeiras,
etc.
10h15- Palestra sobre o
lagamar durante o percurso na
balsa no Ribeira Prof.
Domingos/Unesp
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12h Almoço
12h Almoço
12h Lanche
(Cada estudante leva o seu)
13h Mesa de
debate:
Comunidades
Tradicionais e
Cultura
Caiçara
(Adriana Lima
e Dauro do
Prado)
13h Músicas,
jogos, piscina,
brincadeiras,
etc.
13h 30 Visita ao sambaqui,
palestra sobre manguezal e
estudo do meio
14h
Fandango
caiçara
(Grupo do
Prelado)
14h30
Encerramento
14h30 -
Encerramento
14h30- Encerramento
Fonte: elaborada pelo autor.
ALMOÇO CAIÇARA
Uma das características fundamentais do “Espaço Caiçara” é a comida típica. Ela faz
parte do nascimento do projeto. Assim, o almoço caiçara foi a etapa do projeto que encerrou a
programação da Semana Caiçara. Começou cedo com o café caiçara que foi servido com bolo
de roda, banana da terra cozida, biju, paçoca de carne seca, coruja, farinha manema e outros
pratos típicas da culinária caiçara.
O café caiçara foi servido numa casinha de palha com parede de bambu onde um fogão
a lenha mantinha aquecido o aperitivo para quem fosse ver a exposição na escola.
A casinha de palha foi construída na entrada da escola para possibilitar a reflexão a
respeito do estilo de moradia local, pois na casa é possível aprender sobre a construção da
parede de taipa, parede construída com bambu e argila batida como se faziam nas comunidades
tradicionais da região.
Da casinha caiçara, o povo seguia pelo corredor onde estavam expostas fotos da região.
No pátio, um painel grande com o logotipo do projeto estava posicionado atrás da mesa das
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palestras e, ao lado, duas mesas comportavam artefatos locais. De um lado, um mestre artesão
confecciona um cesto de cipó de timbopeva. De outro, um cóvo de bambu para capturar peixe
no rio.
Enquanto os artefatos eram confeccionados, as palestras e as apresentações aconteciam.
As temáticas das palestras versavam sobre meio ambiente, comunidades tradicionais, turismo,
patrimônio material e imaterial e outros temas relacionado ao projeto.
Próximo ao horário do almoço ser levado à mesa, o grupo de fandango da AJJ entrou
em ação. Os violeiros posicionam-se na frente do painel e começaram a tocar as modas do
fandango. Os mais experientes foram para o meio do pátio e deram início a dança. Aos poucos
os estudantes foram entrando na roda e logo a escola toda estava dançando o fandango caiçara
e, em seguida, o almoço caiçara foi servido com uma grande variedade de comidas típicas,
possibilitando que os participantes conhecessem a riqueza da culinária local.
A 16ª. Edição do “Espaço Caiçara” aconteceu nos dias 21 e 22 de outubro de 2022 e a
programação completa está abaixo.
FIGURA 3 Programação do Espaço Caiçara de 2022
Fonte: acervo pessoal.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Até aqui foi realizado um relato de experiência sobre o início, desenvolvimento e a
atualidade do projeto “Espaço Caiçara”. Procurou-se mostrar que este projeto tem uma forte
relação com a luta das comunidades tradicionais caiçaras da Juréia, no que diz respeito ao
direito ao território que lhes foi tirado pela expulsão “por cansaço”. A AJJ soma-se com a Escola
Sebastiana no sentido de contribuir no resgate e valorização da identidade local que foi
desacreditada por conta do distanciamento do território e da expansão do turismo desordenado.
A realização das iniciativas, em conjunto, contribuiu para o surgimento de questões que fizeram
do “Espaço Caiçara” um veículo de pesquisa sobre a identidade caiçara e uma conquista
coletiva, pois conforme salienta Alonso (2003) aprender a trabalhar em conjunto é um objetivo
de formação que se impõe hoje para todas as pessoas em qualquer situação que se considere.
Na verdade, é uma condição necessária para a formação do cidadão em uma sociedade
democrática(ALONSO, 2003, p. 99).
O trabalho em conjunto, visando contribuir na formação do cidadão democrático e
consequentemente numa sociedade mais justa e igualitária, vem sendo fortalecida por meio do
“Espaço Caiçara”, pois tem trazido mais empolgação à escola.
A gestão do projeto também tem a preocupação de oferecer aos estudantes condições
para refletirem a educação a partir da realidade em que vivem podendo decidir se querem partir
para outra realidade ou se pretendem ficar onde moram e construir uma vida digna.
Por fim, que o projeto Espaço Caiçara” tenha vida longa e que possa inspirar, capacitar,
entusiasmar, sempre instigando conquistas de espaços maiores de diálogos e construções
coletivas.
REFERÊNCIAS
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Gestão educacional e tecnologia/ Organizadores: Alexandre Thomaz Vieira, Maria Elizabeth
Bianconcini de Almeida, Myrtes Alonso- São Paulo: Avercamp, 2003.
BRANDÃO, Carlos Rodrigues. O que é educação. São Paulo: Brasilienses, 2007. (Coleção
primeiros passos, 2007).
BRANDÃO, Carlos Rodrigues (Org.) Pesquisa participante. 8. ed. São Paulo: Brasiliense,
2006.
CASTRO, Rodrigo Ribeiro de. Expulsão por cansaço e resistências. Dissertação de mestrado
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apresentada ao Instituto de filosofia e Ciências Sociais da UNICAMP, na área de antropologia
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LARROSA, Jorge. Notas sobre a experiência e o saber de experiência. Leituras da Secretaria
Municipal de Campinas, Campinas, SP. N. 04, julho de 2001. SP.
MELO, Teresa Mary Pires de Castro. A Floresta, a Mesa e as Leis: espaços, comunicação e
mudança cultural em comunidades tradicionais da Estação Ecológica Jureia-Itatins.
Dissertação de mestrado apresentado ao departamento de Comunicação e Artes da
Universidade de São Paulo. São Paulo, 2000.
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(Orgs.). Rio de Janeiro, Associação Cultural Caburé, 2006.
RODRIGUES, Carmem Lúcia. O lugar do Fandango Caiçara: natureza e cultura de “povos
tradicionais”, direitos comunais e travessias no Vale do Ribeira (SP). 2013. Tese (Doutorado
em Antropologia Social) Instituto de Filosofia e Ciências Humana Antropologia Social.
Campinas, 2013.
ROLNIK, Suely. Pensamento, corpo e devir. Uma perspectiva ética, estético, política no
trabalho acadêmico. Palestra proferida no concurso para o cargo de Professor Titular da
PUC/SP, realizado em 23/06/93, publicada nos Cadernos de Subjetividade, v.1 n.2: 241-251.
Núcleo de Estudos e Pesquisas da Subjetividade, Programa de Estudos Pós-Graduados de
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WUNDER, Alik. “Encontro de águas” na Barra do Ribeira: imagens entre experiências e
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Recebido em: 01 de dezembro de 2022
Aceito em: 29 de dezembro de 2023