Ao assinalar os significados da educação para as classes populares oitocentista, a autora
informa que ao lado das reivindicações por educação escolar estatal havia diversas iniciativas
da sociedade civil, incluindo aquelas ligadas ao movimento operário organizado, que
compunham o amplo espectro de iniciativas do educar-se das classes populares (p. 37).
Trazendo para sua análise, por exemplo, algumas passagens de crônicas do escritor carioca João
do Rio, Ana Luiza identifica reflexões, saberes e conhecimentos entre cocheiros, estivadores,
marinheiros, construtores de presépios, leitores e pintores em seus momentos de trabalho e
lazer, com os quais se indica o uso popular da escrita e sua presença na arena pública, no caso,
nas ruas (p. 38-39).
Ao analisar a atividade dos tatuadores, arte praticada por trabalhadores pauperizados,
Ana Luiza destaca uma cena em que o tatuador demonstra saber escrever já que deveria tatuar
o nome na pele de um cliente. Assim, ela salienta existir flagrante contradição entre as
estatísticas que apontavam a elevada taxa de analfabetismo e a realidade em que se observa,
por outras fontes, o uso popular da escrita (p. 39).
Ao afirmar que a educação não se restringia à escola, assim como a forma de atuação
política praticada pelas classes populares não se vinculava ao parlamento e ao voto, Ana Luiza
adverte que a concepção que idealiza a participação política somente como aquela que se
relaciona institucionalmente com o Estado por meio do voto – uma visão meramente
institucionalista – pode deixar de fora o conjunto de ações praticadas pelas classes populares
tão necessárias para a sua sobrevivência e existência social, bem como para a exigência do
direito à educação. Por isso, a autora realiza o exercício de compreender a história a partir das
experiências e dos fazeres das classes populares, na perspectiva de estruturar sua narrativa a
partir dos “de baixo” (p. 40).
Interessada em narrar a partir da perspectiva dos “de baixo”, mas sem perder de foco o
poder das elites para submeter e manter a sua hegemonia, a autora demonstra, por exemplo, que
a Lei Saraiva, ao instituir a separação entre instrução e experiência, se constituiu em importante
mecanismo de interdição dos direitos políticos do povo negro, pois proibia a criação de
organizações de trabalhadores negros para evitar que se alfabetizassem (p. 64). Vigiar a atuação
dos negros para impedir sua organização e resistência ao sistema escravocrata e colonial era
uma prática constante das elites, como salientou a autora na passagem em que discute o Ofício
de 27 de março de 1835, no qual Euzébio de Queirós solicita vigilância policial sobre as
reuniões para coibir o aprender a ler e escrever dos “pretos minas” (p. 36). Sabe-se, contudo,
que as elites não apenas operavam a estrutura de poder para impedir que os negros fossem
sujeitos de direitos, mas, sobretudo, que acessassem o principal meio de produção para a