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DE MEMÓRIAS E AFETOS:
DIÁLOGOS COM EX-ALUNOS DOCENTES DA FEUSP
Elizabeth dos Santos Braga
Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo, Brasil
elizabeth.braga@usp.br
Roni Cleber Dias de Menezes
Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo, Brasil
roni@usp.br
RESUMO
O presente artigo resulta da análise de depoimentos produzidos em outubro de 2019 quando da
comemoração dos 50 anos da crião da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo
(Feusp) e dos 60 anos da Escola de Aplicação da Faculdade de Educação da Universidade de
São Paulo (EA-Feusp) junto a seis ex-alunos(as) da Feusp, os(as) quais, tendo ingressado no
curso em distintos momentos, tornaram-se, anos depois de terem concluído a graduação em
Pedagogia, docentes na instituição. Com o material buscou-se tematizar a elaboração das
memórias pelos sujeitos a respeito da própria instituição, de seus itinerários formativos e dos
nexos destes com os acontecimentos mais amplos na esfera potica, social, cultural e
educacional.
Palavras-chave: Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo. Memória. Roda de
conversa.
ON MEMORIES AND AFFECTIONS:
DIALOGUES WITH FORMER STUDENTS PROFESSORS OF FEUSP
ABSTRACT
This article results from the analysis of statements produced in October 2019 when
commemorating the 50th anniversary of the creation of the Faculty of Education of the
University of São Paulo (Feusp) and the 60th anniversary of the School of Application of the
Faculty of Education of the University of São Paulo (EA-Feusp) with six former students of
Feusp, who, having joined the course at different times, became, years after completing their
graduation in Pedagogy, professors at the institution. With the material, we tried to thematize
the elaboration of memories by the subjects about the institution itself, their formative
itineraries and their connection with broader events in the political, social, cultural and
educational spheres.
Keywords: Faculty of Education of the University of São Paulo. Memory. Conversation
circle.
A PROPOS DE SOUVENIRS ET D'AFFECTS :
DIALOGUES AVEC DES ANCIENS ÉLÈVES MEMBRES DU CORPS
ENSEIGNANT DE LA FEUSP
RÉSUMÉ
Cet article résulte de l'analyse de témoignages produits en octobre 2019 lors de la
commémoration du 50e anniversaire de la création de la Faculté d'Éducation de l'Université de
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São Paulo (Feusp) et du 60e anniversaire de l'École d'Application de la Faculté d'Éducation de
la Université de São Paulo (EA-Feusp) auprès de six anciens élèves de la Feusp, qui, ayant
commencé le cours à différents moments, sont devenus, professeurs de cette institution, des
années après avoir obtenu leur diplômes en pédagogie. A partir de ce matériel, nous avons
cherché à thématiser l'élaboration de souvenirs par les sujets sur l'institution elle-même, ses
itinéraires de formation et leur lien avec des événements plus larges dans de différentes
sphères : politique, sociale, culturelle et éducative.
Mots-clés: Faculté d’Éducation de l’Université de São Paulo. Mémoire. Cercle de conversation.
DE RECUERDOS Y AFECTOS:
DIÁLOGOS CON PROFESORES EX ALUMNOS DE LA FEUSP
RESUMEN
Este artículo resulta de la análisis de testimonios producidos en octubre de 2019, en las
celebraciones de los 50 os de la creación de la Facultad de Educación de la Universidad de
São Paulo (FEUSP) y los 60 años de la Escuela de Aplicación de la Facultad de Educación de
la Universidad de São Paulo (EA-FEUSP), por seis ex alumnos de la facultad que, habiendo
ingresado al curso de Pedagoa en diferentes momentos, se convirtieron, años después de
terminar la licenciatura, en profesores de la institución. Con el material se buscó tematizar la
elaboración de memorias por los sujetos sobre la propia institución, sus itinerarios formativos
y su nexo con acontecimientos más amplios en los ámbitos potico, social, cultural y educativo.
Palabras clave: Facultad de Educación de la Universidad de São Paulo. Memoria. Círculo de
conversación.
Não há paraíso nem para a memória nem para o esquecimento.
Só o trabalho de ambos e modos de trabalho que têm uma história.
Uma história a se fazer.
(Marcel Detienne, A invenção da mitologia, 1992, p. 14)
INTRODUÇÃO
A história da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (Feusp) remonta
aos primeiros anos da década de 1930, quando é criado o Instituto de Educação em São Paulo
(1933), decorrente da publicação do Código de Educação, durante a gestão de Fernando de
Azevedo à frente da Diretoria de Instrução Pública do estado de São Paulo. Em 1934 o Instituto
de Educação é incorporado à recém-criada Universidade de São Paulo (USP)
1
, ato que aparece
1
Conforme Bontempi Jr. (2011), tal incorporação, excetuando-se as justificativas de razoabilidade técnica,
administrativa e epistemológica, integrava a própria configuração do campo educacional naqueles anos 1930, em
que [...] uma conjunção de fatores, tais como disputas internas pelo poder na universidade, interesses profissionais
dos discentes, rivalidades entre as áreas do conhecimento e lutas por status” (BONTEMPI JR., 2011, p. 188),
desempenharam impacto decisivo na configuração das propostas e modelos de formação docente tanto no interior
da USP quanto dos dirigentes e intelectuais da educação do período.
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no Decreto de fundação de 25 de janeiro. Quatro anos depois, em 1938
2
, com o Decreto
Estadual 9.268-A, de 25 de julho, o Instituto de Educação é extinto e, como Seção de Educação
(4ª Seção), passa a fazer parte da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da USP (FFCL-
USP). No mesmo ano, em consequência do Decreto Estadual 9.403, de 10 de agosto, definiu-
se a transferência do pessoal lotado no Instituto e de seu acervo para a 4ª seção da FFCL-USP
3
(ANTUNHA, 1975). Com a supressão do Instituto de Educação, a formação de professores
secundários se concentrou na FFCL-USP, por meio de sua Seção de Educação, ficando a
formação docente em vel primário a cargo da Escola Normal Caetano de Campos.
As a definição do primeiro regimento interno da FFCL-USP, instituído por força do
Decreto 12.038, de 7 de julho de 1941, em conformidade com as alterações promovidas pelo
Decreto 12.511, de 21 de janeiro de 1942, a Seção de Educação passa se chamar Seção de
Pedagogia, organizando-se então em três cadeiras: Administração Escolar e Educação
Comparada, História e Filosofia da Educação e Psicologia da Educação. Como assinala Santos
(2015), a cadeira de Didática Geral e Especial “[...] compunha uma seção distinta e não era
parte da Seção de Pedagogia da FFCL-USP”, tendo se reunido apenas em 1962, quando da
criação do Departamento de Educação (SANTOS, 2015, p. 46). Em 1962, com a criação do
Departamento de Educação, o curso de Pedagogia é reestruturado, tendo sido estabelecidos dois
grandes núcleos: um de natureza “comum”, destinado aos estudantes matriculados nos diversos
cursos da FFCL, e que contava com as disciplinas de Pticas de Ensino, Metodologia e
Didática; e outro de caráter específico”, abarcando nomeadamente três áreas de atuação:
Administração Escolar e Educação Comparada, História e Filosofia da Educação e Metodologia
Geral de Ensino e Disciplina Autônoma de Orientação Educacional (VIDAL; BONTEMPI JR.;
SALVADORI, 2016). Conforme esses autores,
[...] a disposição interna do Departamento de Educação em três cadeiras
apresentava sinais daqueles que viriam a ser os três departamentos da
Faculdade de Educação, separada da Faculdade de Filosofia, Ciências e
2
As instituições que antecederam a Faculdade de Educação Instituto de Educação (1933-1938), Seção de
Educação da FFCL-USP (1938-1942) e Seção de Pedagogia da FFCL-USP (1942-1962) funcionaram no edifício
que abrigava a então Escola Normal Secundária de São Paulo, Escola Normal Caetano de Campos, situada na
Praça da República e que atualmente abriga a Secretaria estadual de Educação. A partir de 1962, quando é criado
o Departamento de Educação, as atividades são transferidas para um prédio do CRPE-SP (Centro Regional de
Pesquisas Educacionais de São Paulo), localizado na Cidade Universitária, na antiga Fazenda Butantã, zona Oeste
da cidade de São Paulo. Com a criação da Faculdade, em dezembro de 1969, o curso de pedagogia permanece no
mesmo local, onde se mantém aos dias atuais, com algumas ampliações e intervenções no prédio original
(ANTUNHA, 1974; FÉTIZON, 1994; BONTEMPI JR., 2011; SANTOS, 2015).
3
Em 1939 a Seção de Educação passa a se chamar Seção de Pedagogia, “[...] acompanhando o novo formato
previsto para funcionar em todas as universidades brasileiras pelo Decreto-Lei nº 1.190, de 4 de abril” do mesmo
ano (VIDAL; BONTEMPI JR.; SALVADORI, 2016, p. 1424-1425) e depois, em 1962, Departamento de
Educação (ANTUNHA, 1975, p. 35).
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Letras, criada a partir do Decreto 52.326 de 1969, que aprovava o Estatuto da
Universidade de São Paulo. (São Paulo, 1969, p. 242). (VIDAL; BONTEMPI
JR.; SALVADORI, 2016, p. 1431)
Assim, a área de Administração Escolar e Educação Comparada engendrou o
Departamento de Administração Escolar e Economia da Educação (EDA) (separando-se deste
a disciplina de Educação Comparada, que veio a se integrar ao EDM); de Metodologia Geral
do Ensino surgiu o Departamento de Metodologia Geral de Ensino e Educação Comparada
(EDM); e da área de História e Filosofia da Educação resultou o Departamento de Filosofia da
Educação e Ciências da Educação (EDF) (SANTOS, 2015, p. 181). Nesses moldes, criada
formalmente pelo decreto supra, de 16 de dezembro de 1969, cuja promulgação resultou dos
efeitos produzidos pela Reforma do Ensino Superior (Lei 5.540, de 28 de novembro de 1968),
nascia a Faculdade de Educação, a qual principia suas atividades em de janeiro de 1970.
Penin e Souza (2010) assinalaram que a reforma universitária que levou à criação da
Feusp trazia em seu bojo a intencionalidade de organizar um currículo de matiz mais técnica,
[...] isolando as demandas da educação fundamental das demandas da universidade como um
todo(PENIN; SOUZA, 2010, p. 19). Ainda conforme as autoras, [...] a rápida expansão do
ensino superior privado e o freio colocado sobre o crescimento das universidades blicas
tentaram desarticular a relação entre a formação de pesquisadores e a formação de professores”
(idem, p. 19). O enfrentamento a essas duas disjuntivas atravessou a hisria da Faculdade de
Educação nesses pouco mais de 50 anos de vida. A organização do curso, os itinerários
formativos, o fortalecimento institucional da pesquisa obtido com a criação do Programa de
Pós-graduação, em 1971 , a interlocução com outras unidades de ensino na própria USP, com
outras instituições de ensino superior e com atores variados do campo educacional, o
movimento estudantil e as demandas postas pelas necessidades de formação e qualificação
docente, em perspectiva diacrônica, são outros temas que regularmente comparecem nas
tentativas de se debruçar sobre a história da Feusp. No exercício que segue, espécie de exegese
sobre a reelaboração de alguns desses temas por parte de ex-alunos e ex-alunas da instituição e
atualmente docentes na casa, lançamo-nos ao empreendimento de inteligir a propósito de como
as memórias estudantis acionam a verve analítica na reconfiguração dos itinerários individuais
e destes em conexão com a faculdade e, em função das circunstâncias, em comércio também
com aspectos mais gerais do desenvolvimento das ciências da educação, da formação docente,
do movimento estudantil e da potica educacional.
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RODA DE CONVERSA COM EX-ALUNOS(AS) QUE SE TORNARAM DOCENTES
Em 2019 foram celebradas duas efemérides na Faculdade de Educação da
Universidade de São Paulo (Feusp). Os 50 anos da criação do próprio estabelecimento de ensino
superior e os 60 anos da Escola de Aplicação da Feusp
4
. Ao longo de todo o ano, variadas
atividades foram realizadas para celebrar e refletir, incluindo seminários, exposições, varal de
memória, mesas-redondas, entrevistas e rodas de conversa com ex e atuais funcionários
docentes e não docentes e estudantes, além de publicações acadêmicas.
Este artigo focaliza uma dessas atividades, realizada em 30 de outubro de 2019,
representada por uma roda de conversa com ex-alunos(as) do curso de Pedagogia que
posteriormente se tornaram docentes na instituição, observando-se, tanto quanto foi possível
um equilíbrio entre os participantes quanto aos departamentos que atualmente integram na
qualidade de professores(as). Participaram da roda as ex-alunas
5
Maria Cecilia Cortez
Christiano de Souza (1969-1972)
6
, Maria Letícia Barros Pedroso Nascimento (1976-1981)
7
,
Carlota Josefina Malta Cardozo dos Reis Boto (1980-1983)
8
e Sonia Maria Portella Kruppa
(1980-1985)
9
e os ex-alunos José Sérgio Fonseca de Carvalho (1983-1989)
10
e Marcos Garcia
Neira (1991-1996)
11
. A condução esteve a cargo dos autores do presente artigo e contou ainda
4
A criação da Escola de Aplicação da Feusp está relacionada à Escola de Demonstração, erigida pelo Centro
Regional de Pesquisas Educacionais de São Paulo (CRPE-SP) em 1959, no local em que atualmente está instalada
a Feusp. Um pouco antes da extinção oficial do CRPE-SP, que ocorre em 1974, a Escola de Demonstração é
vinculada à Feusp, em 1972, assumindo seu nome atual, Escola de Aplicação (GORDO, 2010, p. 47-48).
5
Em parênteses os anos de início e término do curso de Pedagogia.
6
Maria Cecilia Cortez Christiano de Souza é professora titular aposentada da Feusp. Professora na graduação e
pós-graduação, ao longo de sua trajetória acadêmica, Maria Cecilia pesquisou os seguintes temas: relações étnico-
raciais na escola; memória e cultura escolares; história das instituições escolares; história da profissão docente;
arquivos e documentação escolares; formação de professores; história da psicologia e da psicanálise na educação
brasileira.
7
Maria Letícia Barros Pedroso Nascimento é professora associada do quadro ativo de docentes da Feusp. Atuando
na graduação es-graduação, pesquisa atualmente os seguintes temas: educação infantil (com destaque à temática
das creches); sociologia da infância; relações geracionais, políticas públicas e direitos da inncia.
8
Carlota Josefina Malta Cardozo dos Reis Boto é professora titular da Feusp e, no presente, chefe do Departamento
de Filosofia da Educação e Ciências da Educação, gestão 2021-2023. Professora na graduação e na pós-graduação,
pesquisa atualmente os seguintes temas: história da cultura escolar; história da escola e dos processos de
escolarização; história do pensamento e das práticas pedagógicas; história dos intelectuais e historiografia;
filosofia e história das ideias pedagógicas; circulação cultural e história transnacional da educação; direitos
humanos, democracia, política e memória.
9
Sonia Maria Portella Kruppa é professora doutora da Feusp. Atuando na graduação e na pós-graduação, pesquisa
atualmente os seguintes temas: Estado; políticas públicas; planejamento e avaliação; organismos multilaterais de
cooperação (Banco Mundial); educação de jovens e adultos; formação de professores; economia solidária.
10
JoSérgio Fonseca de Carvalho é professor titular e, no presente, presidente da Comissão de Pós-graduação
em Educação da Feusp, gestão 2020-2022. Professor na graduação e na pós-graduação, pesquisa atualmente os
seguintes temas: direitos humanos, democracia, política e memória; hermenêutica e educação; potica e educação
nas obras de Hannah Arendt e Jacques Rancière.
11
Marcos Garcia Neira é professor titular e, no presente, diretor da Feusp, gestão 2018-2022. Professor na
graduação e na s-graduação, pesquisa atualmente os seguintes temas: educação física escolar; currículo;
formação de professores; teorias pós-críticas.
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com o contributo das funcionárias do Setor Técnico de Comunicação e dia da faculdade,
Lilian Curiel Passeri e Maria Clara Bueno, responsáveis por gravar a atividade e,
posteriormente, realizar todo trabalho de edição do material audiovisual.
FIGURA 1 - Roda de conversa - Biblioteca da Feusp - 30 de outubro de 2019
Da esquerda para a direita: Sônia Maria Portella Kruppa, Marcos Garcia Neira, José Sérgio, Fonseca
de Carvalho, Carlota Josefina Malta Cardozo dos Reis Boto, Maria Letícia Barros, Pedroso
Nascimento e Maria Cecilia Cortez Christiano de Souza.
Fonte: Acervo do Setor de Comunicação e Mídia da Feusp.
Para além da riqueza de cada um dos itinerários dos/as participantes, tivemos a fortuna
de abranger, exclusivamente nos referindo ao períodos em que cada um cursou a graduação,
um arco temporal que vai do início dos anos 1970 quando ingressa na Feusp Maria Cecília
Cortez até a primeira metade dos anos 1990 época de estudos de Marcos Garcia Neira,
percorrendo, desse modo, épocas distintas que puderam ser sopesadas a partir de ângulos que
se diferenciaram tanto pelas experiências individuais quanto pelas configurações temporais a
que cada um dos integrantes esteve afeto.
Alguns aspectos dos relatos
12
dos participantes da roda se repetem, com suas
respectivas particularidades, em fuão das perguntas feitas pelos condutores/entrevistadores,
do período histórico em que viveram antes, durante ou logo após a ditadura militar no Brasil
12
Os relatos foram transcritos por Beatriz Braga Coelho. Os nomes dos sujeitos estão abreviados pelas primeiras
letras e os cortes realizados marcados por [...]. Foi feita uma seleção em função do que queamos realçar e algumas
marcas de oralidade foram retiradas, assim como pequenas alterações feitas para melhorar a leitura e a
compreensão. Os fragmentos das falas foram revistos pelos entrevistados e alguns sugeriram pequenos acréscimos
ou alterações. Quando os relatos são citados no corpo do texto aparecem em itálico e, no caso de ênfase em algum
trecho, este é posto em negrito.
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e da própria situação da roda de conversa. Optamos por comentar alguns desses aspectos,
muitas vezes entretecendo e realçando elementos da história coletiva. Também mantivemos a
ordem do dia da roda de conversa, já que algumas falas aparecem como respostas ou
comentários às precedentes. Além disso, os relatos estão quase na íntegra, pois entendemos que
seus autores são personagens importantes da(s) história(s) contada(s) e vivida(s). Suas vozes
são nossa matéria-prima. A cada um(a), agradecemos enormemente por compartilhar conosco
e com a posteridade tão ricos depoimentos que mesclam histórias de sujeitos individuais, de
grupos e da instituição.
MEMÓRIAS DA PARTICIPAÇÃO POLÍTICA
A primeira participante a se debruçar sobre sua experiência feuspiana foi Maria Cecilia
Cortez, que inicia o curso de Pedagogia ainda em 1969, vivenciando concomitantemente, assim,
o processo de transformação de Departamento de Educação em Faculdade de Educação.
Anteriormente, entre 1966 e 1968, cursara Ciências Sociais na FFCL-USP. São vários aspectos
invocados em suas reminiscências. Prendendo-nos a um elemento associado à alteração da
configuração formal do curso de Pedagogia naquela virada dos anos 1960 para 1970, ressalta
na fala de Cecília Cortez o componente da forte vivência extraescolar dos estudantes,
favorecido pela manutenção das mesmas turmas durante os anos de formação, mas também
indicativo de um traço da sociabilidade acadêmica e de outras condições que atuavam na vida
dos(as) alunos(as) na São Paulo da época. Cecília viveu também o recrudescimento da ditadura
militar pós 1968. Ainda na FFCL, não apenas assistiu como foi alvo da perseguição estudantil
que se intensificou ao longo de seu último ano no curso de Ciências Sociais, ocasionando rias
pries e mortes. Todo esse cenário impactou os rumos seguidos já na Feusp. Conforme Cecília,
seu perfil de aluna era já outro em comparação com a época em que cursara Ciências Sociais.
O medo da vigilância a acompanhou nesses anos de graduação. Ao mesmo tempo, ao revisitar
em lembraa esse período inicial da Feusp, uma imagem bastante forte se projeta na memória:
a de alguns de seus professores que teriam desempenhado um papel preponderante não apenas
do ponto de vista da expertise dos respectivos campos de atuação, mas também pela inspiração
como modelos intelectuais, especialmente no contraponto à tradição catedrática que se fazia
presente no tirocínio de rios docentes naqueles primeiros anos da nova instituição.