- DOSSIÊ “A CRISE BRASILEIRA: 10 ANOS DAS MANIFESTAÇÕES DE 2013”
Os protestos contra o aumento das tarifas de ônibus na cidade de São Paulo, em junho de 2013, foram duramente reprimidos pela polícia e logo se alastraram por todo o país, levando milhões de pessoas às ruas. O poder de atração sobre setores sociais heterogêneos e politicamente desorganizados, o caráter espontâneo, e a ausência de uma direção política reconhecida e legitimada entre os manifestantes, resultaram em uma difusão de reivindicações e bandeiras de lutas, nem sempre compatíveis entre si. O caráter eclético e contraditório destas manifestações, entre outras coisas, esteve relacionado ao nítido rechaço das organizações políticas e à disputa entre correntes políticas e ideológicas distintas, e, em alguns casos, até mesmos antagônicas, como os movimentos populares com viés de esquerda e os movimentos reacionários de extração pequeno-burguesa e de classe média. Nem mesmo a burguesia se absteve de incidir no processo, o que ficou evidente na mudança de cobertura da grande imprensa (que transitou da oposição ao apoio às manifestações e à defesa da bandeira contra a corrupção dos governos do PT) e na apropriação dos protestos para fins publicitários de grandes empresas (como a Coca Cola e a Fiat).
Os protestos de junho interromperam um hiato de grandes manifestações de massas e um período de relativa estabilidade política no país, desde, pelo menos, as manifestações pelo “Fora Collor” em 1992 e a crise do “Mensalão” em 2005, respectivamente. Saíram enfraquecidos não apenas os governos e partidos políticos tradicionais, mas o sistema político como um todo, descredibilizado por amplos segmentos da população. Na mesma esteira, irromperam na cena política novos movimentos sociais, à esquerda e à direita, que lograram conquistar o seu espaço e a influenciar, de maneira mais ou menos decisiva, os acontecimentos mais significativos da política brasileira desde então. Embora não haja consenso, para muitos analistas as manifestações de 2013 representam um ponto de virada na conjuntura e na correlação política de forças, de modo que não seria possível compreender a politização do sistema de justiça, o golpe contra o governo Dilma, a ofensiva neoliberal e a ascensão do bolsonarismo, sem levar em conta este acontecimento de grande envergadura.
Passada quase uma década, as manifestações de 2013 permanecem um importante objeto de estudo e de polêmica entre os estudiosos da realidade brasileira. A caracterização de seu significado político, a explicação de suas causas, a análise de suas consequências, a sua articulação com aspectos de longa duração, constituem um campo aberto e em disputa, dentro e fora do campo do marxismo. No momento atual, de múltiplas crises e ameaças sobre a democracia, é profícuo debater e avançar no conhecimento de 2013 e do período seguinte, em suas diferentes dimensões e perspectivas, para compreender e intervir melhor no presente, buscando melhorar as condições de luta e os cenários para o futuro.
Nesse sentido, convidamos todos os/as autores/as interessados/as em contribuir com reflexões e com resultados de pesquisas sobre o tema, que em toda a sua complexidade pode abranger:
- As manifestações de 2013 e a crise brasileira: as causas e o significado das manifestações de 2013; a sua relação com os acontecimentos políticos subsequentes; as interpretações e as estratégias em disputa.
- As relações e representações de classe: a ação política e a ideologia de diferentes classes, frações e grupos sociais; os movimentos das classes médias; as articulações entre classe, gênero e raça; as transformações na estrutura de classes.
- O Estado e a democracia: o golpe de 2016; a ofensiva neoliberal; a ascensão da extrema-direita; as transformações nas instituições estatais; a judicialização e a militarização da política; as novas direitas e as novas esquerdas.
- Os aparelhos ideológicos: o papel da grande imprensa, das associações empresariais e dos think tanks; a atuação da imprensa sindical e popular; as novas tecnologias; as redes sociais e as mídias digitais; os partidos políticos e movimentos sociais.
- As diferentes crises: crise política; crise econômica e social; crise ambiental; crise do neoliberalismo; crise ideológica; crise das esquerdas; crise de hegemonia; crise do capitalismo.
- Imperialismo e dependência: os novos tipos de golpe de Estado; a desnacionalização da economia; a inserção internacional e as relações interestatais; os regimes de acumulação; a relação Brasil-China.
Além de artigos, aceitamos resenhas e comentários de obras, assim como traduções de entrevistas e artigos. Os textos devem estar de acordo com as normas de publicação da revista, disponível em: https://econtents.bc.unicamp.br/inpec/index.php/cemarx/about/submissions.
A Cadernos Cemarx adota o modelo de publicação contínua, de modo que os textos submetidos e aprovados para o dossiê serão publicados no decorrer do ano de 2023, até o mês de dezembro.
Organizadores/as: Agnus Laureano, André Flores, Carolina Garcia, Francisco Prandi, Octávio Del Passo, Rodolfo Moimaz.